

Ser cor, ser luz
No Jornalismo, a primeira coisa que se faz ao receber, ou estabelecer, uma pauta é perguntar de conhecidos se eles conhecem alguém que se encaixa naquele perfil procurado. Neste caso, alguma pessoa com tatuagens bacanas.
“Minha irmã! Ela tem uns desenhos bem diferentes e coloridos. Tu vai gostar de falar com ela”, respondeu Eduardo Oliveira, o Duh, em um fim de tarde na Universidade Federal do Ceará. Perfeito! Semanas depois da conversa, era chegada a hora de estabelecer o contato.
A primeira impressão foi bem impactante. Ora, já tinha visto as tatuagens do Duh, então esperava qualquer coisa naquele estilo, mas em cores. Bem, as cores foi a única suposição acertada. O choque foi uma pessoa cujo braço parecia ter sido amplamente pincelado e as costas bastante rabiscadas. E tudo aquilo iluminava os olhos.
Já sentada no sofá e com uma xícara de café na mão veio a segunda surpresa, além de fotógrafa - que era a profissão que eu tinha conhecimento -, descobri que Marília era, principalmente, professora da rede estadual de ensino. Também descobri que eu tinha estabelecido uma série de preconceitos, logo eu que estava tentando desconstruí-los. Mas isso, pelo menos, era uma série de boas perguntas.
"Uma professora, de outra escola que eu trabalhei, um vez disse que estavam comentando [das tatuagens] e que era de bom tom eu ir mais coberta. Aí eu disse a ela que, pela quantidade de tatuagens que eu tinha, eu teria que ir de burca. E eu não concordava com isso, e como no teste, quando eu fiz o concurso, não existia um teste físico que averiguasse minhas tatuagens, eu estava apta a exercer o serviço e não ia discutir, mas que agradecia a preocupação dela”. Justo.
“Alguns pais de alunos têm um comportamento receoso do tipo 'essa é a sua professora de português? Não é nem de sociologia, filosofia, mas uma matéria tão careta como o português'".
A ligação entre o trabalho com intervenção urbana e imagem, quem diria, seria outro estereótipo. "Vira meio que um desculpa pro senso comum. 'Ah, porque ela é artista, não é porque ela é drogueira'. Tem essa subcategoria possível".
Muita conversa depois, evidenciou-se a forte relação de Marília com as tatuagens. "Quando criança, minha mãe me dava maquiagem e, eu não pintava o rosto, pintava o corpo, com caneta, canetinha, tinta... Sempre achei muito e bonito e sempre quis ser muito tatuada".
Sobretudo, destacou-se sua ligação com a grande variedade de pigmentos. "As cores existem porque existe luz. Então se você enxerga e tem cor, naturalmente tem luz e ela reflete em você”.
Logo me vi com vontade de ter cor e de também ser luz.